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domingo, 5 de junho de 2016

O quarto de Jack e outras dimensões do amor


O quarto de Jack (2015), do diretor Lenny Abrahamson, é um daqueles filmes que nos deixa em suspensão enquanto o assistimos e essa sensação ainda nos acompanha por um longo tempo. Adaptação do romance O quarto, de Emma Donoghue (2010), conta a história de uma mãe e seu filho presos em um cativeiro por sete anos. Jack, o menino de 5 anos que ali nascera e crescera, é filho do sequestrador/estuprador, o Velho Nick, que os visita periodicamente para trazer o “que eles precisam” e violentar mais uma vez Joy, a maravilhosa mãe de Jack. Baseado na história real que chocou o mundo em 2008, quando foi descoberto que um pai prendeu sua filha por mais vinte anos na Áustria, o filme explora ficcionalmente outros ângulos desse drama.
Joy cria para seu filho um outro mundo, O quarto de Jack. Ali, naquele minúsculo espaço de tanto sofrimento, ela consegue manter uma atmosfera de fantasia que os mantêm lúcidos e ativos diante de tanto terror (ecos de A vida é bela). O único contato com o mundo externo vem da televisão que assistem, mundo que, na primeira parte do filme, ela nega a existência para que seu filho não entenda a sua condição de prisioneiro. Nessa primeira parte, antes da fuga, tudo é claustrofóbico e reduzido. Aliás, esse clima é bem explorado pelas câmeras com seus closes angustiantes, vide as cenas em que Jack fica dentro do guarda-roupa quando Nick vem os “visitar”.

É interessante notar as duas histórias que a mãe "conta" para Jack, O Conde de Monte Cristo e Alice no país das maravilhas. Duas narrativas que dialogam diretamente com o drama deles. Através do primeiro, ela preparará a fuga do esperto menino, que se fingido de morto (seu treinamento para isso é fantástico) será levado para fora do cativeiro por seu próprio algoz. Com Alice, temos a idéia do mundo diminuto e paralelo à realidade vivida por eles, com pitadas de beleza providenciadas pela amorosa mãe.  A literatura usada como bálsamo e salvação.
A segunda parte narra a adaptação deles ao mundo real pós-cativeiro. Essa fase é pontuada por cenas emocionantes e tensas protagonizadas pela família de Joy. Aquela idéia de que a vida cá fora não parou para esperá-los ronda o filme. Sua mãe, já separada de seu pai, vive um segundo casamento e os acolhe amorosamente em seu novo lar. Já seu pai tem dificuldades para aceitar Jack, para ele o garoto é o resultado de um crime. Destaca-se como uma das forças do filme, o poder sem limites do amor materno em suas variadas dimensões, de 10m² ao infinito azul. O afeto incondicional de Joy por Jack e o de sua mãe por ela e pelo neto rendem grandes cenas, dentre elas o primeiro corte de cabelo do menino.

A partir de um drama inimaginável para qualquer um de nós, o filme opta por narrar uma história de rara beleza que nos põe em contato com diversas e confusas questões. Dentre elas, a eterna pergunta platônica sobre o que é mesmo o real. A cena em que Jack volta ao cativeiro e descobre como aquele quarto/mundo era pequeno é puro lirismo e relativização das verdades, pois tudo depende do ponto de vista e do tamanho do nosso mundo. Mundo que vai se ampliando com filmes como esse. Digno de Oscar de melhor atriz para a intérprete de Joy, Brie Larson,  e de ser revisto algumas vezes para que possamos também, pelas mãos de Alice, nos refugiar em outros mundinhos...

 

2 comentários:

  1. Alana, excelente análise. Já assisti ,também. Pena que não foi exibido em nossa cidade que, como sempre, faz jus ao nome de " cidade comercial " . Filmes, só os que atingem o grande público. Aqueles que rendem boas bilheterias. Que pena !

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  2. Olá, cara leitora. De fato, aqui em Feira temos essa carência cultural que vamos driblando como podemos. O filme é muito bom e merece ser visto por mais pessoas.

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