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sexta-feira, 5 de abril de 2019

Órfãos da Terra: Entre o folhetim e a verossimilhança


A nova novela das 18:00h que estreou esta semana já roubou nosso coração desde o primeiro capítulo. Órfãos da Terra, da autoria de Thelma Guedes e Duca Rachid, tem como pano de fundo histórico, para uma grande história de amor proibido, o drama dos refugiados sírios. Parece que estes serão os dois eixos que nortearão a trama:  O amor e a guerra em suas variadas nuances, os dois maiores temas da literatura, senão, os únicos. Com esses ingredientes dificilmente a receita falhará. Poderia ser exibida ás 21:00h, tem força narrativa para o horário nobre.
O aspecto verossímil da trama nos pôs dentro da Guerra da Síria, ferida exposta e aberta do nosso tempo. A história macro da guerra cruza-se com a história micro da família de Laila (Julia Dalavia), a protagonista da trama, difícil dizer mocinha para uma moça tão valente. É como se em meio a milhares de vidas ali destruídas, as autoras pinçassem uma família para individualizar o drama coletivo daqueles que perdem tudo, até mesmo o chão debaixo dos pés. As imagens felizes de uma festa de aniversário foram substituídas, em segundos, por destruição e dor.
Em meio dessa terra arrasada, cenário inóspito de um campo de refugiados, brota (regado por água) o amor proibido de Jamil (Renato Góes) e Laila. Mas como nos bons folhetins, trata-se de um amor proibido. O Sheik Aziz (Herson Capri excelente no papel), vilão por excelência, já havia posto os olhos nela e, por meio de métodos escusos, ganha o direito de desposá-la. Ao fugir para não casar, a jovem atrai a ira do seu algoz. Não bastasse isso, ele é uma espécie de protetor de Jamil, que o tirou do orfanato quando criança e planeja que ele seja seu genro e sucessor. Jamil, portanto, sofrerá do dilema moral de trair aquele que o amparou, mesmo discordando de seu comportamento abjeto.
São claro os ecos de Tristão e Isolda sobre eles. Tristão recebe a tarefa de ir buscar a noiva de seu tio que o criara, o Rei Marcos, e, durante a missão, apaixona-se pela bela Isolda, até a viagem e o navio temos. Mas, como obra contemporânea costurada pelos fios da intertextualidade, torceremos que o final do casal seja outro que não o do drama medieval. Os espectadores torcem sempre por finais felizes.
Ao escolher o tema dos refugiados como fundo histórico, enredo completamente verossímil, as autoras também estão tratando dos imigrantes que  aqui vivem por diversas razões, na maioria por guerras também. Já sabemos que essa Babel paulista nos trará o lado cômico da trama com tantos “brimos” e ‘brimas” brigando e comendo quibe e tabule. Já nesse início, tivemos uma cena de briga entre um árabe (Flávio Migliaccio) e um judeu (Osmar Prado), ressignificando com humor conflitos milenares. Tal cena nos remeteu ao magistral filme Concorrência Desleal, de Ettore Scola. A colônia árabe de São Paulo receberá, em breve, a família de Laila, e o choque cultural certamente aparecerá. Do outro lado do mapa, casamentos arranjados, poligamia, dote... Por aqui, uma prima feminista que mostra os seios na Avenida Paulista, comerciantes tradicionais que têm que se adaptar aos novos tempos, em meio àquele clima de casa árabe com mesa farta, mães dramáticas e muito falatório.
Destaquemos ainda a beleza da novela construída por riqueza de detalhes e símbolos. A abertura é belíssima, um mosaico de vários povos que por aqui vivem e os personagens vão se juntar a eles como naquelas fotografias de família. A oposição entre a casa-palácio do Sheik e a pobreza dos refugiados, a aliança perdida no meio da explosão, a chave da casa que o árabe que vive há décadas no Brasil guarda no bolso esperando pela volta, os despojos no mar, fragmentos de vidas que se dissolvem abruptamente e os abraços frequentes da família para quem a Pátria passa ser apenas o desejo de permanecerem juntos, mostrando que o amor sobrevive em meio aos destroços e é o combustível para continuar buscando uma terra prometida...E a mola propulsora dos folhetins...
Começamos muito bem, e com desejo aceso de continuar assistindo nossas Sherazades, Thelma e Duca, que já nos encantaram outrora com seus cordéis encantados e joias raras, a cada capítulo mal respiramos esperando o próximo, assim como o sultão das Mil e uma noites, afinal o que gostamos mesmo é de ouvir boas histórias para continuarmos vivos e esperarmos o dia seguinte....


19 comentários:

  1. Alana, teu texto e a trama, com tema e "cara" de folhetim das 21h, estão dignos de nossa atenção e aplausos. Essas mulheres empoderadas na narrativa: Thelma, Duca e Alana, ou melhor dizendo... Guedes; Rachid; El Fahl, 2019, têm nos feito suspirar há tempos. No mais... Maktub

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  2. Otima analise. Gostei da trama visual, e estou triste porque vou me afastar por dez dias e gostaria de ver, pelo menos, este início.

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    1. Obrigada, caríssima Licia. Um prazer ter você como leitora. Assine o Globoplay é a solução.

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  3. Texto maravilhoso!
    Parabéns, Alana!
    Quem não viu a novela fica com vontade de acompanhar a trama!

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  4. Parabéns querida, vc realmente capta a essência da trama, estou adorando a novela,torcendo para o casal desde já.

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  5. Entretelas como de costume nos brinda com este texto belíssimo.A trama começou brilhante! A análise do blog nos aproxima de uma tradução do que pode surgir nesta história tão atual e tão dramática. Acompanhemos a novela e o Entretelas!

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    1. Obrigada, cara leitora! Continuemos atentos a esse outro Cordel Encantado.

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  6. Finalmente, um enredo digno para uma novela. Realmente, Cordel Encantado foi perfeita e com todos os detalhes de uma trama bem costurada e que conseguiu prender as atenções e atualmente, apresenta o mesmo sucesso no Vale a pena ver de novo. Jóia Rara foi maravilhosa também e eu nem lembrava. Obrigada, Alana, pela lembrança. Você analisou de uma forma leve e apresentou os detalhes. Espero que as autoras mantenham uma boa trama e não caiam naqueles clichês que ninguém aguenta mais: "Quem
    matou o Sheik Aziz?" Ora, para quê matar o sheik Aziz (Herson Capri)? Um dos melhores da trama e que é bastante charmoso e experiente. Outras atrizes que continuam incríveis são: Eliane Giardini (inesquecível em: O Ninho da Serpente, na Band) e Letícia Sabatela (inesquecível em: A Muralha).

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    1. Cara, May. Quem é você? Vejo que noveleira como eu rsss! As atrizes citadas estão excelentes, Sabatella parece talhada para o sofrimento, faz muito bem esses papéis e Giardini é a própria mãe dramática, como em Caminhos das índias e Dois irmãos... Continuemos de olho..

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  7. Excelente texto, Alana!
    Parabéns!!!

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  8. Ótima análise!Parabéns!Um belíssimo convite para fazer a leiutura das próximas cenas...

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  9. Obrigada, caríssima e refinada leitora! Sua passagem por aqui me alegra!

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  10. Ótima análise. A novela desvenda a realidade dos refugiados que chegam ao Brasil e nos leva a refletir sobre a necessidade de políticas públicas para acolhe-los.

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