Babilônia, cidade perdida e salva...
Ai! Ai! Tu, grande
cidade, Babilônia, tu, poderosa cidade! Pois, em uma só hora, chegou o teu
juízo” (Ap 18.10).
Babilônia, novela das 21:00, mas
que ainda por costume chamamos das 20:00, vai caminhando para o fim nesse mês de
agosto cercada de críticas e da praga da baixa audiência. Sim, a novela é um
produto, e como tal, há de agradar o público consumidor. Começou sob o fogo
cruzado do ataque religioso-fanático que se chocou com o beijo do primeiro
capítulo entre as veteranas Fernanda Montenegro e Nathália Timberg. A cena foi
vítima de duplo preconceito, homofobia e gerontofobia, pois nos diversos
comentários que ouvimos por aí , a dupla questão sempre vinha à tona: "Duas
mulheres e naquela idade"...Contornos foram feitos na trama para tornar o casal
mais palatável ao gosto da família brasileira(marca da obra aberta), o que parece
ter funcionado. Apagou-se o erotismo e acendeu-se o companheirismo.
Creio que a trama peca no eixo
central da eterna disputa entre Beatriz e Inês, as duas protagonistas (Personagens
de Dante e Camões) não nos mostraram força suficiente para elegermos nossa
preferência nessa luta do mal contra o mal, e as eternas sabotagens e tramoias
vão ficando cansativas e repetitivas. E até mesmo os romances das duas são
insossos e sem aquela química que costumamos ver entre os personagens
principais. Todavia, o que falta de êxito no eixo central, parece surgir nas
tramas paralelas. É na lateralidade que nos apoiamos para continuar
acompanhando o enredo.
A família do prefeito (Marcos
Palmeira, excelente no seu primeiro “vilão”) é o núcleo forte da trama. Serve
como vetor para criticar diversos problemas da sociedade brasileira,
funcionando muito bem para a ideia de família como célula da sociedade. Ali
temos a corrupção, a hipocrisia, o falso moralismo, a religião usada como
escudo para justificar injustiças, tudo isso com uma dose de humor que atrai a
simpatia do público. Arlete Sales, grande como sempre, representa o estereótipo
perfeito da sogra-megera-matriarca-deslumbrada-preconceituosa, que comete
atrocidades e se esconde sob o manto do Altíssimo, suas intervenções esdrúxulas
roubam a cena. A nora (grata surpresa da baiana Laila Garin) sufocada-reprimida-traída
começa a se soltar e ameaçar a estabilidade do lar. E a menina Laís (brilhante
revelação Luísa Arraes), confrontando os valores impostos por sua família de porta-retratos,
traz ventos novos para o clã.
E essa “família-modelo” surge
justamente como antípoda da “família invertida” de Rafael, na qual pulula amor,
compreensão e valores morais, a despeito de sua questionada formação. Vale
notar também nessas casas o tratamento que é dispensado aos empregados, outra
critica bem sintomática da nossa ainda “Casagrandesenzala”.
Além desse núcleo lateral, temos
outras histórias que vão brilhando aqui e ali. O romance nascendo entre Ivan e
Sérgio com todas as pressões sociais. A força da solidariedade das famílias na periferia,
o mau-caratismo simpático de Luís Fernando, um tipo bem brasileiro(dialética da
malandragem em alto grau), a graça dos clowns de Norberto e Clóvis, a força
visceral de várias mães em defender suas crias, o preconceito racial e a
atuação policial e jurídica.
Como nessa novela não temos uma
questão principal entre o bem e o mal para torcemos no fim da trama pelo
reestabelecimento da ordem, vamos torcendo para que essas lateralidades
continuem a iluminar nossa sede de ficção, como na bela primeira noite/alvorada
de amor de Rafael e Laís ou no conto de fadas moderno da nossa Cinderela
Regina...Creio que virá nesse último mês cenas que nos aproximarão mais dessa
Babilônia, pois quem fez O dono do mundo,
Força de um desejo, Celebridade e Paraíso Tropical tem estofo para merecer nossa confiança...